Vê-se a tendência banalizadora do dano moral, um pedido, no contexto
temporâneo, utilizado à exaustão em nossos Tribunais. Por se tratar de
um pedido que afeta bens jurídicos imensuráveis ou de difícil
quantificação, em toda demanda cível pede-se, cumulativamente,
indenização por dano moral.
Dessa tendência, adveio o
que se chama de
loteria judicial, qual seja, o direito dos
demandantes posto ao bel prazer da quantificação judicial.
Um
mesmo juiz pode julgar que uma parte possui direito de indenização
decorrente de dano moral no valor de R$ 1 milhão, enquanto colega de
vara similar pode entender que se trata de dano de meros R$ 5 mil reais.
É o direito do cidadão sendo sorteado aos dissabores e pluralidades
culturais e motivacionais do Judiciário.
Dentre esses,
citamos alguns casos:
Os pais de um menino
morto por leões de circo montado no estacionamento do Shopping
Guararapes, em Recife (PE), em 9 de abril de 2000, devem receber
indenização no valor R$ 275 mil, por danos morais e materiais.
O
STJ decidiu que tanto a empresa responsável pelo evento, Sissi
Espetáculos (Circo Vostok), quanto as responsáveis pela locação do
circo, a empresas OMNI e Conpar Empreendimentos e Participações
Societárias - proprietárias do shopping - vão responder de forma
solidária pelo dano.
Diante de um caso de dano moral
decorrente da morte de uma criança por leões de circo montado no
Shopping Guararapes em Recife (PE), em desfavor da empresa responsável
pelo evento, Sissi Espetáculos (Circo Vostok), e das locadoras do circo,
empresas OMNI e Conpar Empreendimentos e Participações Societárias, o
TJ de Pernambuco houve por bem fixar como quantia indenizatória o valor
de R$ 1 milhão ¹.
Porém, quando o caso foi apreciado em
sede recursal pelo Superior Tribunal de Justiça, houve a redução do
valor para R$ 275 mil, com base no "princípio da razoabilidade e nos
parâmetros geralmente adotados".
Frise-se que a
indenização anterior, fixada pelo juiz de primeiro grau, é de
mais de
3 vezes o valor fixado pelo STJ.
Em outra
oportunidade, onde se pode ver a loteria judicial em seu esplendor, a
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reduziu o valor
da indenização a ser paga pela Indústria Campineira de Sabão e Glicerina
Ltda. e outro à Oleol – Comércio de Óleos, Gorduras e Vasilhames Ltda.
para R$ 50 mil².
O valor fixado anteriormente era o
equivalente, no dias atuais, a mais de R$ 4 milhões.
O
valor foi reduzido na ordem de
80 vezes.
Percebe-se,
portanto, que não há um consenso entre os tribunais e juízes singulares
a respeito da quantificação do dano moral, e isto, sem dúvidas, incorre
em um custo social, por conceituação econômica.
Nesse
contexto de insegurança jurídica e falta de parâmetros objetivos na
fixação do dano moral, nenhuma das partes sai ganhando num processo
(sequer a parte vencedora, pois em futuras demandas não poderá lograr
igual êxito, e deverá, haja vista o grau de insegurança, embutir uma
espécie de
spread pelo risco de insucesso judicial em seus
contratos futuros).
E, por via indireta, ainda gera o
descrédito institucional do Poder Judiciário, ante a falta de coesão e
entendimento entre seus próprios integrantes.
A loteria
judicial é um claro exemplo de
peso morto social (deadweight
loss), considerado assim pela Análise Econômica do Direito por não
ensejar benefícios a nenhuma das partes envolvidas no processo.
Uma
das formas com que o Judiciário pode atuar para dar uma maior segurança
jurídica é, portanto, unificar e estipular um
tabelamento do
quantum
indenizatório.
É o que o Superior Tribunal de Justiça
tem tentado realizar, em uma iniciativa louvável, ao fixar algumas
margens de dano moral a assuntos específicos, tais como: morte dentro de
escola (500 salários mínimos), paraplegia (600 salários mínimos), morte
de filho no parto (250 salários mínimos), fofoca social (R$ 30 mil),
protesto indevido (R$ 20 mil), alarme antifurto (R$ 7 mil), dentro
outros³.
A
Jurimetria, como
instrumento de
quantificação empírica dos efeitos jurídicos a partir de um
banco
de dados informatizado, poderá fornecer subsídios e modelos
matemáticos para quantificar a indenização por dano moral em casos
inéditos ou análogos.
Isto se dá, principalmente, por
modelos
comparativos. Um juiz singular, sabendo com fundamento no sistema
Jurimétrico, que outro colega ou seu próprio Tribunal, apto a julgar
recurso interposto em face de decisão sua, julgaram caso similar e
fixaram determinados valores provavelmente, e dadas as circunstâncias do
caso concreto, não discrepará muito das demais condenações.
É
evidente, portanto, a necessidade de formulação de um
banco de dados
jurimétrico contendo os valores de condenação em caso de dano moral
fixados pelos juízes singulares ou dos valores reformados pelo Tribunal.
Com base neste banco de dados, é possível que os julgadores, em
segundo grau, ao apreciarem uma apelação com fundamento no dano moral,
tomem como parâmetro o
desvio-padrão (conceito de dispersão
advindo da Estatística), além ou aquém do qual a sentença merece
reforma, pois desvia de forma significativa da
mediana normal de
valor de condenação.